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Queiras transformação

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- dedicado a @tiaracarvalho Queiras transformação. Sejas entusiasta da chama, Onde te escapa uma coisa que ostenta transformação de raízes. O espírito de criação, mestre da terra, No elã da figura, não ama nada como o ponto de mudança. O que se tranca na permanência, já está petrificado; Será que se imagina seguro no abrigo de uma decrepitude invisível? Espera: a maior dureza, à distância, adverte à dureza. Ai -: o martelo ausente se prepara! Aquele que jorra como fonte o reconhecimento o reconhece E guia em êxtase através da criação serena Que, muitas vezes, com o princípio se completa e começa com o fim. Todo espaço feliz é filho ou neto da separação, Que admiradores atravessam. E Dafne transformada em raízes, Como loureiro, quer que tu te transformes em vento. Rainer Maria Rilke , "12". "Sonetos a Orfeu"

Caixinha de música

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Se alguém quiser ouvir a minha alma Em uma música É só dar corda Em qualquer caixinha Os sons secos, cadenciados São a valsa da minha vida O suspense delicado A melancólica alegria Que, num átimo, acaba E dá voz ao silêncio... Realejo distante, vago Que conduz meu relicário Volteando no infinito Dando corda ao imaginário Eis, no cálculo das batidas, O mistério, o ciclo da vida - Que se rompe sem razão... Eu sou a bailarina do porta-joias Tateando em meu próprio mundo Na engrenagem do vazio Contudo, peço: feche a caixa Deixe-me adormecer e sonhar Com um mundo brilhante de joias Com valsinhas que nunca ouvi Até acordar Se alguém quiser ouvir a minha alma Em uma música ~Renata Ribeiro~

Ladainha

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Teu coração dentro do meu descansa, Teu coração, desde que lá entrou: E tem tão bom dormir essa criança, Deitou-se, ali caiu, ali ficou. Dorme, menino! dorme, dorme, dorme! O que te importa o que no Mundo vai? Ao acordares desse sono enorme Tu julgarás que se passou um ai. Dorme, criança! dorme, sossegada, Teus sonos brancos ainda por abrir: Depois, a Morte não te custa nada, Porque a ela habituaste-te a dormir... Dorme, meu Anjo! (a Noite é tão comprida!) Que doces sonhos tu não hás-de ter! Assim, com o hábito de os ter na Vida Continuarás depois de falecer... Dorme, meu filho! cheio de sossego, Esquece-te de tudo e até de mim. Depois... de olhos fechados, és um cego, Tu nada vês, meu filho! e antes assim. Dorme os teus sonhos, dorme e não mos digas, Dorme, filhinho! dorme, dorme, "oó"... Dorme, minha alma canta-te cantigas, Que ela é velhinha como a tua Avó! Nenhuma ama tem um pequenino Tão bom, tão meigo; que feliz eu sou! E tem tão bom dormir esse menino... Deitou-se, ali...

Escreva

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Quando se escreve, às vezes é preciso abrir mão de tudo e simplesmente ordenar-se: - escreva! Comida no forno, trabalho por fazer, hora de dormir, o que seja; o maior pecado do escritor é resistir ao imperioso chamado da pena. Mas escrever sobre o quê, ele logo se pergunta. Parece que o ato de escrever sempre tem de ter um porquê e um sobre o quê, além dos execráveis e dolorosos como e com que fim (nos dois sentidos da palavra "fim"). O próprio impulso da escrita é tão voraz e inacessível que por vezes se torna impossível pausar-lhe, fazer-lhe qualquer dessas perguntas; o máximo que se consegue é seguir-lhe o rastro, no ritmo sempre atrasado do lápis sobre o papel, da luta retardada entre a coordenação da mão e a do pensamento. "Lutar com as palavras é a luta mais vã", já dizia o nosso nobre guerreiro (e vencedor) Carlos Drummond de Andrade. O guerreiro da palavra é talvez o menos nobre e mais ensanguentado, pois sua arma fere não só os outros, mas ele mesmo, enquan...

Mudam-se os Tempos, Mudam-se as Vontades

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Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, Muda-se o ser, muda-se a confiança: Todo o mundo é composto de mudança, Tomando sempre novas qualidades. Continuamente vemos novidades, Diferentes em tudo da esperança: Do mal ficam as mágoas na lembrança, E do bem (se algum houve) as saudades. O tempo cobre o chão de verde manto, Que já coberto foi de neve fria, E em mim converte em choro o doce canto. E afora este mudar-se cada dia, Outra mudança faz de mor espanto, Que não se muda já como soía. Luís Vaz de Camões, em "Sonetos"

Leitura póstuma dos poetas sempre vivos

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Assombra-me um arrepio Ao ouvir dos versos a música, Neste sarau tardio, A soar sua beleza súbita Opera-se mágica tal Quando se encontram palavra e voz Que subleva-se calor irreal Entre os poetas lidos e nós Homenagem tão grande é esta leitura Que não podemos adivinhar-lhe a glória De revelar a mais perpétua das honras A qual dá-se, em secreto, nesta hora Pois não habita em um nome Pomposo, em ouro, num livro a luzir Mas apenas na alma de um homem Que, ao ler o poema, pôde sorrir...

nem sempre fala-se de amor

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Vai, amor Pra toda a vida Não olhes pra trás Na hora da partida Não me mande lembrança Nem carta amorosa Vivias num perfeito mar-de-rosas Te dei carinho Dei um lar O que pude enfim Não sei porque procedeste assim Agora é tarde para me pedir perdão Eu sigo a ordem Dada por meu coração Eu sei que andava fora da realidade Graças a Deus decidi Sem ter remorso, nem saudade Não chore, por favor Porque um bom perdedor não chora Reconhece a derrota Se dirige a porta Abre, diz adeus E vai-se embora Clara Nunes, a eterna morena de Angola