Suba a minha oração perante a vossa face como incenso, e as minhas mãos levantadas sejam como o sacrifício da tarde. {Salmos 141:2}

sábado, 3 de setembro de 2011

O maior risco da vida



"O maior risco da vida,
e mais perigoso, é amar;
que morrer é acabar,
e amor não tem saída.
E pois penado,
ainda que seja amado,
vive qualquer amador;
que fará o desamado
e sendo desesperado
de favor?"

Gil Vicente, em O velho da horta

domingo, 21 de agosto de 2011


Ah, quanta vez, na hora suave
Em que me esqueço,
Vejo passar um voo de ave
E me entristeço!

Por que é ligeiro, leve, certo
No ar de amavio?
Por que vai sob o céu aberto
Sem um desvio?

Por que ter asas simboliza
A liberdade
Que a vida nega e a alma precisa?
Sei que me invade

Um desejo, não de ser ave,
Mas de poder
Ter não sei quê do voo suave
Dentro em meu ser.


Fernando Pessoa ortônimo - Cancioneiro

terça-feira, 19 de julho de 2011

Calma...


Não somos mais
Que uma gota de luz
Uma estrela que cai
Uma fagulha tão só
Na idade do céu...

Não somos o
Que queríamos ser
Somos um breve pulsar
Em um silêncio antigo
Com a idade do céu...

Calma...
Tudo está em calma
Deixe que o beijo dure
Deixe que o tempo cure
Deixe que a alma
Tenha a mesma idade
Que a idade do céu...

Não somos mais

Que um punhado de mar
Uma piada de Deus
Um capricho do sol
No jardim do céu...

Não damos pé
Entre tanto tic tac
Entre tanto Big Bang
Somos um grão de sal
No mar do céu...

Calma...
Tudo está em calma
Deixe que o beijo dure
Deixe que o tempo cure
Deixe que a alma
Tenha a mesma idade
Que a idade do céu
A mesma idade
Que a idade do céu...

A mesma idade

Que a idade do céu...

(A Idade do Céu - Paulinho Moska)

terça-feira, 17 de maio de 2011

A ordem das árvores não altera os pássaros



GRAFIA 1


Água significa ave

se

a sílaba é uma pedra álgida
sobre o equilíbrio dos olhos

se

as palavras são densas de sangue
e despem objectos

se

o tamanho deste vento é um triângulo na água
o tamanho da ave é um rio demorado

onde

as mãos derrubam arestas
a palavra principia

---

♫♪ Naquele curió mora um pessegueiro
Em todo rouxinol tem sempre um jasmineiro
Todo bem-te-vi carrega uma paineira
Tem sempre um colibri que gosta de jatobá

Beija-flor é casa de ipê

Cada andorinha é lotada de pinheiro
e o joão-de-barro adora o eucalipto

A ordem das árvores não altera o passarinho

Naquele pessegueiro mora um curió
Em todo jasmineiro tem sempre um rouxinol
Toda paineira carrega um bem-te-vi
Tem sempre um jatobá que gosta de colibri

Beija-flor é casa de ipê

Cada pinheiro é lotado de andorinha
e o joão-de-barro adora o eucalipto

A ordem das árvores não altera o passarinho ♫♪

[Fiama Hasse Pais Brandão e Tulipa Ruiz, respectivamente]

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Eu


Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte,
Sou a crucificada... a dolorida...

Sombra de névoa tênue e esvaecida...
Que o destino amargo, triste e forte
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!

Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê...

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver
E que nunca na vida me encontrou!


Florbela Espanca



(admiro tanto que digitei quase todo de memória ^^~)

quinta-feira, 17 de março de 2011

Os anos felizes



Eu tlim ciências
Tu tlim matemáticas
Ele tlim trabalhos manuais
Nós tlim recreio
Vós tlim senhora
Eles tlim castigo


Pintura e poema do poeta surrealista português
Mário Cesariny

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Sorte Grande


O amor tem qualquer coisa de sorte
De acaso, felicidade súbita
Pois é tão raro encontrá-lo
Como tirar duas vezes
A mesma face de um dado

É que o amor é o Sublime
E como tal, não pode ser vulgar
Corriqueiro
O amor é o encontro e o encontro é sagrado
O amor é o desencontro e o desencontro é necessário
O amor nos faz achar que tudo estava escrito
Ou não


Renata Ribeiro

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

4º Motivo da Rosa

Não te aflijas com a pétala que voa:
também é ser, deixar de ser assim.

Rosas verás, só de cinza franzida,
mortas intactas pelo teu jardim.

Eu deixo aroma até nos meus espinhos,
ao longe, o vento vai falando em mim.

E por perder-me é que me vão lembrando,
por desfolhar-me é que não tenho fim.



Cecília Meireles, in Mar Absoluto e outros poemas.



..:: Recomendo o estudo deste poema feito por Maria Luiza Ramos em RAMOS, M. L. O sentimento do eterno. In: ______. Fenomenologia da obra literária. 2. ed. Rio de Janeiro - São Paulo: Forense, 1972, p. 214-221. ::..