Ladainha
Teu coração dentro do meu descansa,
Teu coração, desde que lá entrou:
E tem tão bom dormir essa criança,
Deitou-se, ali caiu, ali ficou.
Dorme, menino! dorme, dorme, dorme!
O que te importa o que no Mundo vai?
Ao acordares desse sono enorme
Tu julgarás que se passou um ai.
Dorme, criança! dorme, sossegada,
Teus sonos brancos ainda por abrir:
Depois, a Morte não te custa nada,
Porque a ela habituaste-te a dormir...
Dorme, meu Anjo! (a Noite é tão comprida!)
Que doces sonhos tu não hás-de ter!
Assim, com o hábito de os ter na Vida
Continuarás depois de falecer...
Dorme, meu filho! cheio de sossego,
Esquece-te de tudo e até de mim.
Depois... de olhos fechados, és um cego,
Tu nada vês, meu filho! e antes assim.
Dorme os teus sonhos, dorme e não mos digas,
Dorme, filhinho! dorme, dorme, "oó"...
Dorme, minha alma canta-te cantigas,
Que ela é velhinha como a tua Avó!
Nenhuma ama tem um pequenino
Tão bom, tão meigo; que feliz eu sou!
E tem tão bom dormir esse menino...
Deitou-se, ali caiu, ali ficou.
António Nobre, Paris, 1894.
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