Suba a minha oração perante a vossa face como incenso, e as minhas mãos levantadas sejam como o sacrifício da tarde. {Salmos 141:2}

sábado, 25 de abril de 2009

Será você?



Será você?
Que vai ler meus gestos
Até mesmo os mais funestos
E ainda vai gostar de mim?

Será você...?
Que vai me ver em suas cores
Aguentar as nossas dores
Me completar e fazer rir?

Que vai ver além dos meus óculos
Que verá a real cor dos meus olhos
Refletidos nos teus?

Que vai me tirar de trás dos meus livros
Que vai me trazer de volta ao perigo
De confiar meu coração?

Será você? Serei eu? Seremos nós?
Nós trazemos os contras
A vida, os prós
Só espero que, no fim, não fiquemos sós...

terça-feira, 21 de abril de 2009

Eu - Florbela Espanca


Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada... a dolorida...

Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...

Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber por quê...

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!

quarta-feira, 8 de abril de 2009


Há dias em que eu me canso
de mim mesma
Me canso de ser eu
Parece que em meu corpo
Não mais cabe minh'alma
Ela se aperta, se ajeita
Até encontrar um meio incômodo
De parecer feliz

Há dias em que eu queria
Engolir o sol
Pra que ele não me queimasse
Com seu olhar vigilante
Nem me ofuscasse
Com tanta luz
Quando eu prefiro a escuridão

Há dias em que simplesmente
Não caibo em mim
Aí descubro, enfim
Que a poesia alargou-me o ser
E que esta perturbação
É a penitência dos filósofos
É a santificação dos poetas.

sábado, 4 de abril de 2009

Com licença poética - Adélia Prado

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta,
anunciou:vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.